28/11/2013 01h04
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (42ªpostagem)
IRACY GENTILI (1930-2002) poeta e artista plástica, integrou o movimento Catequese Poética, iniciado em 1964 pelo poeta catarinense Lindolf Bell. Foi morar em Salvador na década de 70 e criou uma galeria de arte que acabou sendo ponto de encontro de muitos artistas.Publicou Os Rumos(1964) A tudo direi, sim, Sem nenhuma importância. Saberá alguém dos silêncios dos cofres cheios de miçangas Em símbolos de vidro, mais que a verdade caberá. A tudo sorrirei Recolhendo as esperas. Ninguém perceberá a urgência de ontem. Às noites com piedades tão cruas Pedirei que antecipem as anmarras do voo. Caminharei cansada, sem flores nos meus cantos, Pois cairemos, eu sei, Folha por folha, E o verde se perderá num excesso de odor. Quem armazenará o fruto, nestes campos estéreis, Se as flores distribuem-se vestidas de verdade? A tudo hei de jazer calada Num silêncio pletórico de cardos.
Alguém inventará gestações de mármores e bronzes. ........................................................................................................ Assim seremos, tigres, E no jângal deslizaremos em combates. Assim seremos, faunos, E nas campinas dançaremos a aurora. Ah! Tivéssemos jamais amado, E alguma rosa teria lâmpadas de riso, Em alguma árvores seríamos mais sóis. Assim estaremos, cansados Dos templos que fizemos em segredo. Das preces, todas elas sem resposta. Os deuses dormem! Assim extinguiremos. Unos, com tudo o que nos mata. Uno, com tudo o que matamos. ......................................................................................................... Eu falarei De todas as ternuras Que te pertenceriam
Eu falarei Das flores e dos frutos Que abrigarias nos dedos
Eu falarei De todas as canções Que ouvirias crescer
Eu falarei Das paisagens, muitas Que se abririam, claras, para ti.
Eu falarei De estrelas, incontáveis Que no teu céu aos poucos morrerão ........................................................................................
Brancos são os olhos das mulheres Brancas as paisagens
O céu todo branco arqueando-se em horizontes.
Brancos homens? Brancas ruas? Onde estão as cores da vida?
O sol quer se por e nada mudou!
Sempre a alvura infinita Distendendo-se em toda a parte
Os olhos cansam de ver Sempre a mesma paisagem.
Ele.—o que tinha azul nos olhos Que tanto me assombraram Que branca lembrança me deixou!
Ah! Este tédio branco ao meu encalço Onde tudo é loucura,
Este longínquo marulhar de vozes veladas Que passam por mim
E este sussurro de harmonia extinta.
RENI CARDOSO (1945-2008) poeta paulista, atriz, professora, pesquisadora e tradutora. Também integrou o movimento Catequese Poética nos anos 60. Fez mestrado e doutorado na USP e destacou-se como grande especialista em teatro russo. O CAMINHO Não é medo de chegar sozinha: CARTAS A ALESSANDRO 1 O trem partiu. A princípio pensei No teu rosto. Depois, que não existias. No final, deixei de sentir. Tua mão acenou E vi que eras incomparável -o único. 2 Ontem à noite Fui colher uvas E a uveira não deixou.
Hoje de manhã Os meninos roubaram Minhas uvas -todas. 3 Estou como num hotel. Redescubro conversas de um dia anterior E sei que alguma festa está no fim. Converso com tua voz De trás de uma coluna Para sempre.
NILZA BARUDE (1946) poeta paulista, fez parte da Catequese Poética e atuou como jornalista em São Paulo e na Bahia. Dirigiu, criou e apresentou programas na TV. Recebeu título de Cidadã da Cidade de Salvador e publicou Amor/Ação(1995), Contos &Cartas Memórias de um Coração e Reticências (2011).É também artista plástica. 6 Calcei os chinelos velhos de deus E caminhei pelas águas Pela mão de todos os meus irmãos, E dançamos a ciranda das ondas junto com todos os peixes Depois, Exaustos E em paz, Deitamos no leito marinho Entre algas. Adormecemos para acordar Ao lado dos velhos chinelos.
34 A cama vazia não me Angustia mais, Posso dormir em paz. Tua ausência já não tem peso. O meu ser É metal fino e precioso, vale mais na bolsa de valores da vida. Minhas ações estão na ordem do dia. Nada a temer, Adeus. 44 Eu tenho todas as raças liquidadas em meu sangue, Eu tenho todos os povos tombados em meus braços, Eu tenho o estigma desse tempo, E tenho o sangue e a terra misturando-se e restaurando-se In memorian. Eu tenho as trincheiras nas costas e asas nos pés, Que me levam a todos os continentes. Eu tenho em cada olho uma bomba detonada, E na boca uma granada por explodir. Eu sou o produto desse tempo discutido em dialética. Eu sou a hipótese e a síntese matemática dos acontecimentos. Eu sou a criança metralhada, Eu sou a angústia da humanidade toda, Que se desfaz, Aprendendo a morte, Dia a dia. Publicado por Rubens Jardim em 28/11/2013 às 01h04
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