27/05/2012 00h48
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (21)
AMNERES, poeta paraibana, mora em Brasília desde 1979.É formada em letras e em jornalismo pela UNB. Promove e participa de leituras públicas. Publicou Humaníssima Trindade (1993),Rubi (1997), Razão do Poema (2000) e Entre Elas (2004). Estreou com a antologia Emquatro (1985) em parceria com mais três poetas brasilienses. Soneto Antes que o tempo transborde antes que a nascente estanque antes que o desejo murche e o outono se achegue. Antes
Que os olhos se embaracem sob o impacto da velhice (como se a alma dançasse e o corpo só assistisse)
Antes que a luz esmoreça antes que o dia anoiteça toma-me, amor, uma vez mais
Antes, amor, que eu te esqueça antes que a chama adormeça como a espuma se desfaz.
Gaivota Como uma corça, A poesia me alcança E sopra em mim brisa morna, Sereno, centelha, esperança.
Como uma puta, A poesia se apossa de mim, Carne viva, e me excita E de esperma me ensopa.
Como uma rosa, Uma mina, uma luz, Pedra preciosa, A poesia seduz.
Como uma Lãmina, A poesia em mim corta, Faca afiada me esgarça E me encharca e me aborta.
Como enseada De aldeia remota, a poesia gaivota em mim voa e liberta e arrebata.
Como uma enchente Na veia dos dias, A poesia transborda, Torrente, vazão, travessia.
Auto-retrato
Eu sempre andei assim quase absorta quase abstrata quase perdida
Eu sempre entristeci quase obscura quase culpada quase escondida
Eu sempre amei assim quase obscena quase extremada quase exaurida
Eu sempre percebi ser esquisita quase obtusa quase maldita
Eu sempre fui assim quase uma atriz sonhando ser o amor e ser a amada
Eu sempre fui assim quase exaltada quase encantada quase feliz.
VERA AMERICANO, poeta mineira, residiu entre Goiás, Rio de Janeiro e, mais tarde, em Brasília. Estudou Letras na UNB, e fez mestrado em Literatura Brasileira na PUC/RJ. Atualmente, trabalha na Consultoria Legislativa do Senado Federal, na área de cultura e patrimônio histórico. Publicou os livros A hora maior (1970) livro premiado pela UBE e Arremesso Livre (2004) Duplo mortal Postar-se no desvão entre dois argumentos, por dois segundos.
Respirar economicamente entre duas palavras, duas ondas muito crespas.
Decidir em sânscrita ilusão: viver ou deixar para mais tarde.
Pequeno Roteiro Tenso
A palavra exata Desferida Do último pavimento Abre uma cratera Extravagante na certeza absoluta.
Cratera
Daqui pode-se ver: a eternidade termina logo ali.
Filme noir
Um silêncio oco, de catedral, passos ressoam, uma porta bate.
Se você não percebeu, fui eu, definitivamente.
CLAUDIA ROQUETTE PINTO (1963) poeta carioca, formou-se em tradução literária ,dirigiu o jornal cultural Verve e começou a publicar nos anos 90. Já tem cinco livros de poesia publicados: Os Dias Gagos (1991), Saxífraga (1993); Zona de Sombra (1997); Corola (2001 – Prêmio Jabuti de Poesia/2002) e Margem de Manobra (2005). POEMA SUBMERSO olho: peixe-olho que dedos tão tentáculos ei-lo ao pé da frincha que
a Novalis
Ainda úmidas sobre a folha, orvalho escuro que pousa na pele, imperiosa e nua. Mal desgarradas da pena, cada pequena curva tatua as ideias na superfície ácida. Isto imagino, se te vejo debruçado sobre a mesa o penhasco olhos anoitecidos despencando no hiato das ventanias. Isto, enquanto imprimo os teus Hinos à Noite nestas folhas ordinárias, palavra por palavra coagulando na brancura ininterrupta, saídas da boca da máquina como uma carta pela fenda da porta duzentos anos mais tarde e úmidas, ainda. O torneado... O torneado hábil das palavras o dissonante vão das consoantes não podem mais – nem por um instante – buleversar o meu pequeno alento. E já nem tento, ainda que fugaz fosse o prazer no momento do encontro satisfazer com tais materiais minha volúpia pelo contratempo. Abandonar o ritmo, eis tudo: mudar de logradouro – ou de logro – que isso de escrever é jogo perdido de antemão, no mano a mano. Mas sem ressentimento: o mais são nuvens, e todos os poemas um engano. O naufrago No escuro sobre o vazio A escada de jacó Ela estava rindo ZÉLIA BORA poeta paraibana, escritora, crítica literária e professora. A autora tem doutorado em Estudos Portugueses e Brasileiros, pela Brown University, USA e atualmente é professora de Literatura Brasileira da Universidade Federal da Paraíba. Publicou A Grande Mãe e outros poemas( 2006) e De Eloísa para Abelardo, poemas jamais escritos (2008) Eis o meu pedaço de mundo A PALAVRA vida que me sustenta meu cotidiano horizonte de minha vida e de minha morte vago nesse mundo das coisas como o Absoluto não resisto à experiência dos objetos que me cercam: sol mar pássaros estrelas eis a linguagem infinita das coisas.
*** Me possuo, desabrochada em pura felicidade do momento pacto secreto da finitude. Me possuo, como a erupção do meu absoluto. Meu Outro, alma exilada que agora volta para casa saciada de tantas viagens TU, meu verdadeiro outro
*** Mergulho em ti. Sou esse ente desenraizado que se dá ao extremo... e convida-te a assumir o teu próprio ser para além dos nossos corpos. Não te percas nas possibilidades fatuais, pois A MORTE É CERTA. Acompanha-me vida minha encontra esse outro modo da certeza que emerge dessa estranha alegria.
A Garcia Lorca
Inventei uma dedicatória santa, como se tu tivesses oferecido a mim o teu último poema. Assim, pensei arrancar de ti o fluxo poético desta descontinuidade chamada vida, interrompido pela morte assassina. Porém, sabias que bendita e antiga é a morte e então, aprendeste a aplacar esta agonia difícil de conter chamada vida, comunicada pela ilusão das palavras. Por isso penso: é tempo de arrancar de mim essa agonia, esse amor incurável de inventar, não mais resistir ao apelo impessoal e descomedido das palavras que atordoam o espírito como uma dor pungente de adeus. Ainda assim, entrego-me à solidão das palavras.
Publicado por Rubens Jardim em 27/05/2012 às 00h48
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