Rubens Jardim

A poesia é uma necessidade concreta de todo ser humano.

Meu Diário
29/09/2015 12h32
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (66ª POSTAGEM)

MÁRCIA RÚBIA( 1957)  poeta baiana, é graduada em letras e pós-graduada em planejamento educacional. Participou de várias antologias e concursos literários e já foi premiada várias vezes. Colaborou com os jornais Sudoeste, Et Cetera, O Rascunho e Jequié, escrevendo matérias, crônicas e poemas. Atualmente é membro da Academia de Letras de Jequié. Publicou seu primeiro livro no ano passado: Procura-se a Poesia.

DOIDA VARRIDA

Por que não fugir

Dessa tempestade que arrebata

Fantasia insana, labaredas

O meu corpo em chamas.

Vivo num mar sem fundo

Náufrago em uma ilha

Personagem sombria e louca

Aprisionada em martírios.

Por que não afugento

Os fantasmas do meu duplo?

Repousa uma montanha russa

No vale do meu delírio.

E por ser a eremita

Da gruta dos caminhos

Anjos, bruxas e duendes

Farão um banquete de redemoinhos.

E por não demolir

Paredes de solidão

A santa e profana amordaça

Os papas da Inquisição.

 

A SHALLENGER

Subiam a vidas

na chama do desconhecido

ansiosas

felizes

quase deuses!

Mergulharam em sonhos e nuvens

flutuando infantis

dentro do ônibus

qual pássaros.

Era tão fácil transpor fronteiras

fazer valer canhões em guerras

ou capitalismo

(onde também o orgulhoso olho de Reagan

alçava vôo com os ícaros alado).

A mente humana palmilha os céus

em futurismo exótico

quando a coragem acasala-se com o infinito.

É tão fácil desafiar os céus de artifícios...

Sem anacronismo respiramos o avanço:

são prodígios do homem e da tecnologia.

O que poluiu o universo foi a morte sem poesia...

 

OS LIVROS

Existem coisas que se aprendem com a Natureza:

respirar ar puro

caminhar pelas manhãs

abraçar um sonho

lutar pela vida

e ter sentimentos em forma de estrelas.

Existe algo bonito:

olhar para os lados

e encontrar amigos

vestidos de papel

esperando ser folheados.

É um hábito gratificante:

brincar com as letras

correr atrás dos sentimentos

que escapam das páginas

brincar de amarelinha com as ideias

torcer por um final feliz

ou conhecer de perto

o lado cinza da existência...

A leitura é um banho maravilhoso na alma

é vestido novo por dentro

é laço bonito de cultura

é disciplinar os momentos

Criança

aperte a mão do livro

na aprendizagem da vida.

LEIA!

Os livros são bons amigos!

 

SONIA BARROS (1968) poeta paulista, nasceu em Monte Mor e desde a infância mora em Santa Bárbara d´Oeste (SP). Formada em letras, fez teatro, dança e canto. Publicou 17 obras para de literatura infanto juvenil, dentre eles: Coisa boa, O gato que comia couve-flor, Asas de dentro .  Em poesia, 3 livros: Mezzo Voo (2007 ), Fios (2014) e Tempo de dentro , estes dois últimos vencedores do Prêmio Paraná de Literatura, na categoria poesia. em 2014 e 2017 respectivamente.

NOVELO

Ao descer do palco,

desejava carregar

cada personagem,

feito um sapo

colado às costas:

pele, carne, vísceras

de outra pessoa

ou bicho

                    para poder não ser.

Príncipe-marionete

guiado por fios

fantasmas não queria

— nem no palco —

só se pudesse

encenar-encarnar Teseu

e o real deixasse

de ser labirinto

                    para tornar-se caminho:

Ariadne a resgatá-lo

por um (único) fio.

 

SEM LUGAR

                                            (a partir do poema “vida minúscula” de Donizete Galvão)

para quem nasceu destinado

não à enxada

mas a trabalhar em casa

alheia, repetindo

a lida materna,

o desejo do voo

– mesmo rasteiro –

fazendo da palavra

seu meio de vida

é quase uma afronta

ao imutável destino:

casulo-mordaça

sempre a lembrar

o devido lugar

 

da menina lagarta.

 

HERANÇA PATERNA

Não nasci sem pai:

ele esperou até que eu nascesse.

 

Depois,

ao constatar o sexo frágil

de sua quarta frágil-filha-mulher,

ele, o homem forte,

se foi.

 

Como herança,

deixou-me esta aptidão

para vôos interrompidos:

 

                                eterno fugir

de onde nunca estivemos.

 

MAHLER MONUMENTAL

Ouvir com todos

os sentidos:

espírito absorto

peito a expandir-se

paz e desconforto

nostalgia e angústia

na mais profunda, nua

solidão.

Desintegrar-se

ao som de sopros, sonhos,

saltos por entre escombros

de vidro e veludo:

espírito partido

disforme

sempre suspenso

sobrevoando pântanos

e colinas à exaustão

– sôfrego percurso

de toda a humanidade num só homem

perdido em céus

 

de impossível redenção.

CLARISSA MAIORINO ZELADA (1970) poeta paulista, nasceu no interior de São Paulo: São José dos Campos. É formada em psicologia pela USP e atualmente é graduanda em letras na mesma universidade. Publicou o livro Tatu Inverso (2013), Seu próximo livro se intitula Fugacidade. Escreve regularmente no seu blog www.tatuinverso.com

PUDIM

Meu seio

na concha

da tua mão

pousado

lembra

uma colherada

de pudim

roubado

num assalto

à geladeira

 

no meio

da madrugada

balança

sem pratos

desequilibra-se

transgride

a lambida

nas costas

da colher

mulher

adormecida.

 

FALTA

No mundo dos excessos

sinto apenas falta

sinto pelas minhas faltas

sinto pelos meus excessos

sinto pelo mundo

a tua falta

tão una

tão simples

a duras penas

a tua, apenas.

 

CONFESSO-TE

Confesso-te intimamente: te roubo.

 

Hoje, ontem, desde que te conheci

te roubo antes mesmo

antes de nascer, antes de existir

pois te roubo a memória

daquilo que não vivi.

 

Persigo-te incansavelmente

o sonho, a pele enquanto dormes

aproprio-me dos teus contornos e

desnudando-te, ocultando-me vou

em tuas vestes.

 

Que saibas que te roubo o gesto

o rastro, teu prato predileto

e quanto mais o faço

mais és novo, mais és outro

renasces em mim

em sonhos como flores

que me brotam da perna

ramos, folhas rebentam

de uma forma singela

e tão docemente me colhes

que pareces saber

que o faço desde sempre e

sem importar-te, deitas

mais tantas outras vezes

em meu ventre

a tua semente.

 

CIGARRO

No carro ao lado

ao volante vai

queimando um cigarro

enquanto espera o sinal

vermelho

na ponta em brasa

estático o tempo passa

consumido no papel.

 

Espera, me deu vontade

de conversar com a fumaça

do teu cigarro, confusa, sinuosa

uma conversa feita de silêncios

ascendentes espirais de pensamentos

perder-me na fumaça, esfumar-me

lua arredondada no céu

da boca soprada, escapar-me

por narinas, olhos lacrimejados

ser este cigarro que tragas

queimar-me na brasa

abraçar o tempo consumido

nas cinzas da vida

palpável.

 

No verde me disperso

acelero, me despeço.

 

SIMONE DE ANDRADE NEVES (1974) poeta mineira, é advogada e teve poemas publicados no Suplemento Literário de Minas Gerais, Poesia Sempre, Revistas Mininas e Polichinelo. Em 2006 participou, como convidada, do projeto arte no ônibus e da pelada poética, 2010 e 2013. Publicou os livros Coração como engrenagem(1994) e Corpos em marcha(2015).

O TEMPO ABRANDA AS COISAS

O Sol

fez branco

o terço rosa

deixado

sobre o túmulo.

 

O GADO

Os bois
cabeças e patas
em círculo centrípeto
urram e propagam
montanhas acima,
às orográficas, uma morte.

 

Cessado o réquiem
citadinos!
talhamos o bife
frigimos até as vísceras
apaixonados
sem compaixão.

 

MARULHO
A cólera do mar
na cólica das águas
nos recifes:
choque de água e pedra
nos rochedos
a interrupção.
Ondas do mar
no percurso
da arrebentação

 

DUCHAMP ARDIDO

O aposto

e o hermetismo

Tal urina, urinol

um coração expande amorfo

a decompor dejetos metafísicos

cavo, calva, a cova.


Publicado por Rubens Jardim em 29/09/2015 às 12h32

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