Rubens Jardim

A poesia é uma necessidade concreta de todo ser humano.

Meu Diário
01/02/2016 14h43
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (71ª POSTAGEM)

CLAUDIA SCHROEDER (1973) poeta gaúcha, é formada em publicidade e propaganda pela PUCRS .Publicou um livro aos 14 anos e outro aos 17 na sua cidade natal, Santo Ângelo. Hoje é Diretora de Criação de uma agência de propaganda e mãe de Theodoro. Publicou o livro de poemas Leia-me toda (2012)

ÚNICO

No fundo, no fundo

no fundo

do útero

da banheira plástica

do berço

e da casa

somos só eu

e você.

Qualquer terceiro

nos sobra.

 PÁLPEBRAS

Quando as pálpebras dobram duplamente

é porque estou velha.

É porque estou anja, calejada, já eterna.

É porque sou passada do tempo

mesmo que o cônjuge me ache linda

ao vento.

Quando o espelho mostra que o meu piscar

faz duas dobras

eu vejo tudo o que sobra

tudo o que fica

e o que me conforta.

Vejo que o tempo não passou:

está passando

bem na minha porta.

Mas não tenho mais fôlego

para trocar de endereço.

Ele me acha, mesmo assim:

tem um pacto com os correios dos anos.

E então eu tento não piscar resoluta

para que as pálpebras não se dobrem

absolutas.

Mas elas o fazem bem no risco

entre a sombra

e a pele virgem:

uma dobra entre a fronteira da maquiagem

e da estiagem

do tempo sobre a minha pele.

Quando há dobras nas pálpebras

o meu eu se dobra

para o tempo

agora.

 EM BRANCO

As minhas canetas sem carga

deixaram tudo em branco:

os bilhetes

as cartas

o papel da pipoca perdido no banco.

Só podiam ver o escrito

tocando os dedos.

(O afundar da ponta da caneta sem tinta

deixou escrito o que eu tinha a dizer:

todos os meus segredos.)

E a vida ficou em braile às avessas.

EU

Eu só queria que você olhasse

para a minha alma

e visse

a calma

a cama

a ama

a dona

a chorona

a fraca

a frágil

a mesma.

 

Por fora sou uma.

Por dentro sou tantas

aos prantos

(Mas só

de vez

em quando).

ADRI ALEIXO(1975) poeta mineira, é formada em letras pela UEMG  e escreve poemas desde a juventude. De vez em quando arrisca alguns contos. Possui textos publicados em jornais locais e no espaço virtual  Pétalas Poéticas. Publicou os livros de poemas: Des.caminhos(2014) e Pés (2015).

CONFISSÃO

Você pensa, mas pouco me sabe

talvez saiba daquele nosso crepúsculo

que o rosa-azul-lilás é a cor que me furta

e algumas bobagens que disse pra te distrair

mas  não sabe que se saio ao sol

é porque me chove e  me alago de ti

nem que meu solo é grave.

Sou teu verbo: defectivo.

O que não confesso

inscrevo em versos.

Eu, precipício

você, cântaro amor.

 

CALEFAÇÃO

Os pés cansados:

cadafalso, candelabro.

Pisar minúcias

nas costas, o mundo

os filhos nos braços.

 

E você diz que a mulher deve ter pés delicados.

 

VOO

vê, são flores

mas parecem palavras

voando

à procura de pouso

 

REGOLITO

Quando saio,

nunca sei aonde vou

me perco entre as ideias do caminho.

Meus pés querem céu

meu corpo, um canto ribeirinho.

Se volto, é porque um astro

me prende ao chão.

 

O antúrio sempre me cumprimenta à porta.

LOU VILELA(   ) poeta potiguar, é administradora especialista em logística. Vive no Recife desde a infância. Possui poemas publicados na agenda da Tribo (2012/2013/2014), e em diversos sítios na internet. Foi incluída no livro Maria Clara – uniVersos Femininos (2010). Publicou o livro  de poemas Pulgas de Concreto(2014)

IX

a moça da saia vermelha

nada me dizia

estava ali, impassível, em sua beleza ácida

queria voar

não havia asas

apenas poesia – ponte aérea

entre vãos

e todas aquelas vozes celulares

ar rarefeito unindo

motivos, vidas, saguão

TARDE GRIS

não me tomes por triste quando relato

o meu, o teu - o nosso cansaço

entrecortado

animosidade gutural

não me tomes por triste

só poeira, olhar alérgico

descompasso

trans.formação

não, não me tomes por triste

cada veio, cada rasgo provém

de um tempo que esfola

e abriga

REFLEXOS

é esse teu olhar invasivo

que atordoa...

 

essa tua tatuagem olfativa

que embriaga...

 

tuas unhas que marcam,

tua saliva que cura.

 

são os teus trejeitos que ins.piro,

os teus trajetos que invado

entre mentes dentes dedos e falo.

enquanto transbordas

me alago.

 

FLUIDEZ

Acordei com o sal da palavra.

Logo hoje, dia de deslembrar,

Invade-me traçado

Um corpoema.

Acordei com o sal da palavra.

Toda a metáfora liquefeita

Entre os vãos

De minhas coxas,

Vontade de escorrer

Sem margens.

SILVANA GUIMARÃES (1969).poeta mineira, é socióloga e escritora. Organizou e participou de algumas coletâneas, entre elas, Hiperconexões — Realidade Expandida Vol. 2 (Org. Luiz Bras, Patuá, 2014) e 1917-2017 — O Século sem Fim (Org. Marco Aqueiva, Patuá, 2017). Editora da Germina — Revista de Literatura & Arte e do site Escritoras Suicidas. Lança seu primeiro livro, de poesia, em 2018.

habeas corpus

nada como a esperança para curar as dores

de uma era oca: beco da morte-sem-saída

 

nada como o ódio para acelerar o rumo de

uma história infeliz de busca & apreensões

 

[quando a minha fome beija a sua sede

meus olhos se encontram com meus olhos

 

minha alma fareja o que sobrou dos restos

mais humanos do corpo ultrajado: o meu]

 

descarregaram a ira em apenas um que era

multidão: ela atira tinta em vez de sangue

 

aqui não é paris: mas a estrela brilha sobre

os ratos de ocasião: dizem que vão pegá-los

 

que venham os bárbaros: inda que seja tarde

que cheguem com mais fúria: com mais medo

 

banquete

a mesa posta

cerejas lichias

uvas castanhas

ameixas pão

 

o corpo morto

abocanhado

vida-vísceras

cristo-a-cristo

 

repartido em vinho

comungado no pernil

 

o estupor nos

fios de ovos

no arroz com

passas & nozes

 

nas asas fincadas

ao meu redor

mamuskas

a trisavó cresceu com a mania de recolher nuncas

a bisavó passou a vida colecionando nãos

a avó, entre rezas, reunia quimeras

a mãe empilhava lamúrias

ela habituou-se aos muros

a filha junta janelas

a neta, pássaros

CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA

impossível fechar as pernas

e matar a borboleta que

voa voa voa entre elas

 


Publicado por Rubens Jardim em 01/02/2016 às 14h43

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