Rubens Jardim

A poesia é uma necessidade concreta de todo ser humano.

Meu Diário
10/03/2016 15h09
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (73ª POSTAGEM)

NÍVIA MARIA VASCONCELLOS (1980) poeta baiana, é professora e mestre em literatura e diversidade cultural. Ganhou, em 2007, o 7º Festival Vozes da Terra de Feira de Santana-BA, com a música “Soneto que não queria existir”. Publicou os livros de poesia Invisibilidade (2002), Escondedouro do Amor e Outros Versos sob a Espera (2008) e A Morte da Amada(2013). Integra o grupo de declamação  Os Bocas Do Inferno.

O amor não está na estrela

que, ao cair, carrega o pedido sussurrado,

está no olhar que a percebe  e espera.

 

O amor não está nas cartas

lançadas sobre mesas postas,

está na tensão de quem as ouve e deseja.

 

Búzios, números e datas

não contém o amor,

ele não está numa procura.

 

Rezas, promessas e velas

não trazem o amor,

só a esperança de encontrá-lo.

 

Mas, ninguém encontra o amor,

ele é(misteriosamente) despertado...

num momento de distração e abandono.

 

CAÇOADA

(releitura do poema Consoada, de Manuel Bandeira)

A indesejável das gentes chegou

(Duríssima... nem um pouco caroável).

Eu tive muito medo,

Não sorri e nada disse a iniludível.

O dia não foi bom, a noite não aconteceu.

(Só vieram dela seus sortilégios)

E nada estava pronto: campo, casa.

A mesa não estava posta,

Mas ela veio mesmo assim.

Assim, com tudo fora do lugar...

 

KOPH

Amanhã, talvez seja abril,

E o pior dos meses se faça,

Mas,agora, ao findar-se a noite,

Ressuscitam os girassóis e,

O poeta, de peito aberto,

Entre as molduras da carta,

É a criança que avança

Em minha direção.

 

Mesmo que amanhã haja corpos a enterrar

E digam em alta voz:

HURRY UP PLEASE IT’S TIME,

Hoje há felicidade e o sol encharca o dia de êxito

...........................................................................................

Quando a amada morre,

Não é seu corpo que fenece,

Mas o desejo que existia por ele

E tudo o que era romance e espetáculo.

 

Não é a mulher que padece

Quando a amada morre,

É o amador que deixa de existir

E tudo é enterro, tudo é luto.

 

Não há coisa mais triste

Do que uma amada que morre

E que, quando morre, mata.

 

Quando a amada morre,

Parece a poesia

E viver é expiação e tormento.

 

Mas tudo revive quando,

Como um susto, outra amada surge

E com ela (de novo) o encanto.

 

MAH LUPORINI, (19  ) poeta paulista, é jornalista. Natural de São José dos Campos, reside em São Paulo. Colaboradora da revista eletrônica Mallarmargens, editou seu primeiro livro de poemas Ausências, (2010) de forma independente. Tem trabalhos publicados em sites de literatura. Seu segundo livro, Traço de Sombras, foi publicado em 2014.

CANTOS PAULISTANOS

I

Na Bela Cintra

Com a Alameda Santos

corpos

traduzem sombras

desenhados

pelo giz da noite

como uma pintura

de Modigliani

Amor blindado

nos teus lábios

Quero-te no desequilibrio

do meu riso

II

Consolação

de tornozelos

soltos

no girassol da noite

Sobre nós,

as palavras

deslizam

junto

ao casaco de

oito pernas

meu espírito

se despede

Tenho que

voltar

ao mosaico

do meu corpo

III

Ensaio

de outros eu

Na poltrona

do meu ego

pêndulos dos

corpos

na cômoda

do tempo

transpondo

a imagem

de quem

sou

PARA JACK KEROUAC

Encolho as noites

de setembro

No mural da

tua pele

Os outros em mim

quebram

O silêncio no

sapato da noite

 

 

SIMONE TEODORO(1981) poeta mineira, estudou letras na Universidade Federal de Minas Gerais, foi professora de literatura e fez mestrado na mesma instituição. É leitora compulsiva de poesia. Distraídas Astronautas (2014) é seu livro de estreia. Atualmente coordena as atividades de incentivo à leitura da Biblioteca Pública  de Belo Horizonte. Mas confessa: “poderia ter sido engenheira, lutadora de MMA, freira ou saxofonista. Uma vida só não basta:  sou poeta.

NÃO ERA

Não era vento:

Era ser forte

Era ser fraco

E, às vezes, sem rumo.

 

Não era chama:

Era um gosto na língua

Era umidade entre as pernas

Era angústia de amar.

 

Não era outono:

Era a superfície da pele

Alcatifada por rugas.

 

Não era um trilho de trem

Uma estação ferroviária

Um aeroporto

Nem mesmo o mar

Com um barco distante:

Era a vida que restava

Acorrentada à ausência.

 

Não era chuva:

Era tristeza pura.

E só.

 

DISTRAÍDAS ASTRONAUTAS

O céu sempre me pareceu

tão masculino

todo azul

e com um deus morando  dentro

(segundo as narrativas da mãe

quando eu ainda era o inchaço em seu ventre

e captava sussurros

pelas viscosidades da placenta).

Um deus de barba branca

no trono, ela dizia.

Trovejante voz paterna

ordenando o alternar dos dias

e das estações e dos tons de azul

do céu

que sempre me pareceu tão masculino

Porque lá tinha um trono.

Porque lá tinha uma ordem.

Porque lá tinha um grito.

Mas então vem a lua

e um império inteiro desaba.

Odores de fêmea

umedecem os ares.

A lua, inchada

como a barriga da mãe

quando me contava mentiras

A lua, pálida ou vermelha

ou quando uma sombra ameaça

sua estranha claridade.

E de perto (bem de perto)

-Por dentro-

Uma profusão de chagas escancaradas

Crateras

sobre as quais

distraídas astronautas

de tempos em tempos

vêm pisar

alargando feridas

fincando bandeiras

enlouquecendo

Para, em seguida,

desaparecerem para sempre.

 

JARDINAGEM II

O jardim era belo

Visto por qualquer passante.

Visto de qualquer ângulo,

era incrivelmente belo.

Tulipas

Gérberas

Miosótis

E cravos.

De qualquer ângulo,

Não havia dúvida.

Mas não para quem

ousasse se deitar

Entre os canteiros.

Não para quem

atraído pelo pulsar das cores

enxergasse o jardim pelo avesso

ao se aproximar demasiado

deixando o olhar escorrer

por um caule

até encontrar

sob a umidade da terra

fixadas

monstruosas raízes.

 

SOBRE ARDER

Eu sei

Ousei flertar com claridades

Mas sou filha do breu

E agora me recolho

Barroca e contorcida

 

(Minhas frágeis asas de cera...)

 

E ela era um verão

Inteiro em minha cama

Ardendo


Publicado por Rubens Jardim em 10/03/2016 às 15h09

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