20/05/2017 21h19
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (92ª POSTAGEM)
GENI GUIMARÃES (1947) poeta paulista, iniciou a carreira literária publicando poemas em jornais no interior de São Paulo. O primeiro livro, Terceiro filho, foi lançado em 1979. Em 1980, aproximou-se do movimento negro e publicou mais 2 livros de poesia: Da flor o afeto, da pedra o protesto (1981)Balé das emoções (1993). Também publicou livros de contos e de literatura infantil. MINHA MÃE Gosto da inocência dela: Benze crianças, Faz simpatias, Reza sorrindo, Chora rezando.
Gosto da inocência dela: Apanha rosas, Poda os espinhos, Coloca nas mãos, De meninos branquinhos.
Gosto da inocência dela: Conta histórias longas, De negros perdidos, Nas matas cerradas, Dos chãos do país.
Ama a todo o mundo, Diz que a ida à lua, É conto de fada.
Gosto da inocência dela: Crê na independência, E é tanta a inocência, Que até hoje ela pensa, Que acabou a escravidão. … Inocência dela…
QUANDO ME VEM... Quando me vem oferecer uísque aproveita o dedo que segura a taça e me indica a porta, disfarçadamente. Eu consciente do direito a festas, (inclusive a comemorada no mês de maio) bebo. E não saio.
BICHO DA SEDA Nascia
Um belo dia, emoção forte me causou vertigem, mamei minha mãe na fonte de leite fiz um verso virgem.
Dos rios mastiguei os córregos dos sóis sorvi dourados bicos tomei do alfabeto, os símbolos com eles fiz um verso rico.
Mas, da primeira cobra armada em botes, aprendi as contorções molengas tomei da angustia, vida fluída ri um verso duro, capenga.
Sou hoje colheita descoberta dos amores de auroras nas fazendas, extração dos capitães de mato e dos de Areia do Jorge.
Explico então:
o poeta é um bicho de seda... que explode
INTEGRIDADE Ser negra Na intregridade Calma e morna dos dias
Ser negra De carrapinha, De dorso brilhante, De pés soltos nos caminhos Ser negra, De negras mãos, De negras mamas De negra alma
Ser negra, Nos traços, Nos passos, Na sensibilidade negra.
Ser negra, Do verso e reverso, De choro e riso, De verdades e mentiras, Como todos os seres que habitam terra.
Negra Puro afro sangue negro, Saindo nos jorros Por todos os poros
HERCÍLIA FERNANDES (19 ) poeta potiguar, é professora da Universidade Federal de Campina Grande. É pesquisadora ligada aos estudos histórico-culturais e dispõe de artigos publicados em livros, periódicos e anais de congressos. Publicou o livro de poemas Nós em miúdos(2015). Pedagoga e mestra em educação está fazendo doutorado. E E quando a manhã chegar, faço-me Scarlett O’hara... levanto as sobrancelhas e convenço-me que é outro dia
E FOI não pronunciou nenhuma palavra
e foi como se dissesse tudo
no nada
CHEIAS queria não pensar em você montar acampamento em seu corpo
viveríamos sem terra, sem pressa, sem adornos
À AURORA DO CAMINHO tudo o que sonhamos, abandonamos à aurora do caminho:
a flor o orvalho o espinho
o agasalho fora do ninho.
LISA ALVES (1981) poeta mineira, é curadora da revista Mallarmargens e colunista da revista Elenismos. Têm poemas publicados nas revistas Incomunidade (Portugal), Zunai, Flaubert, Parênteses, Germina Literatura, Cronópios e Diversos Afins. Recentemente lançou seu primeiro livro de poemas Arame Farpado(2015). Vive em Brasília onde colabora com o fanzine feminista de Salto Alto. DECLARAÇÕES MORIBUNDAS ou como as coisas nunca mudam de fato. Éramos filhos de gerações – que não geravam ações, apenas a experiência de erros que não deveriam ser repetidos. Éramos muitos: fardados, naturalistas, modistas e contra tudo que fosse dito proibido. Éramos luz e trevas ao mesmo tempo – e ainda assim ajoelhávamos nas catedrais espirituais em busca de alguma salvação. Éramos príncipes, plebeus e as vezes democratas que sacudiam as ruas com placas e faixas reivindicando alguma mudança na consciência coletiva. Éramos trabalhadores e acreditávamos que a carga horária do dia nos tornaria a futura elite do país. Éramos bárbaros – matávamos por comida e por um pouco de fogo e sexo Éramos pré-colombianos, pré-greco-romanos, pré qualquer coisa escrita pela história oficial. – e ainda tiveram a ousadia de nos catequizar, estuprar e classificar nosso chão de Brasil Colônia. Éramos revolução industrial: fábricas, camponeses em áreas urbanas, favelas crescendo, densidade demográfica, fome, miséria e falta de saneamento básico. Éramos anarquistas, comunistas, populistas e fazíamos reuniões politico-intelectuais sem ao menos sentirmos no paladar o gosto do feijão requentado. (ou até a falta do mesmo) Éramos padres e madres – rezávamos antes mesmo do sucumbir do sol e em noites enluaradas éramos insistentemente perseguidos pela voz do Demônio da Luxúria. Éramos Ladys e gentlemans – freqüentávamos as melhores festas, fumávamos charutos contrabandeados e no final do mês nossos cheques especiais estavam estourados. Éramos artistas marginais – escultores, pintores, escritores e compositores. Até o dia em que a Industria Cultural levantou uma cerca e transformou as grandes obras em linhas de produção. Éramos leais militares – direita, esquerda, volver! Nossa marcha era conduzida pelo patriotismo, idiotismo e porquê não dizer: fascismo!? Éramos a pequena burguesia – cidadãos médios, assalariados, diplomados, comungados e porquê não dizer: conformados!? Éramos tudo isso – um bando de ações que mataram as gerações. FILHOS DE MADALENA Alastra-se um cobertor virótico neste solo. Quem dorme não terá mais chance de dizer: Bom dia! Fazemos nossa parte: vendemos nossas vidas. Hoje nossas genitálias rendem o prato do dia.
WOOLFS & STORNIS AQUI DENTRO Eu sou desordem. Exterminadora de Eus passados. Alma em cálice de vida. Corpo entregue à ruína. Eu sou canção do exílio – inteligência colonizada. Segredo para mais de 500 anos. Império de sem terras, de sem tetos e de sem vergonhas. Meu sexo é algema, mácula e saia longa. Meus olhos esperam o não sei o quê. Curso pontes e pinguelas desafiando Leis e o Reich da Gravidade.
CURTAS DE MEUS LONGAS II Sou a mesma figura que caminhou ao lado de ideais que sucumbiram ao tempo: assisti a Revolução Francesa apesar de ter nascido no Brasil de 1981. Fui agente comunista, embora nunca tenha comido criancinhas. E agora sou um fruto capitalista: apodrecido dentro do mercado.
CLARA BACCARIN(19 ) poeta paulista, formou-se em letras e fez mestrado pela UNESP (Araraquara). É autora do romance Castelos tropicais (2015), do livro de poemas Instruções para lavar a alma (2016) e do livro de crônicas Vibração e descompasso (2017). Escreve para diversos sites e em 2017 teve poemas gravados no CD Lavar a Alma. Morou na Austrália, Chile e Hungria. entre silêncios e entrelinhas entre peles e recantos entre vãos e desvios entre a coincidência dos olhares e a refração dos espelhos entre os escafandros e os nus em pelo Amar é sempre um tiro no escuro
DECEPADO ele me mandou uma foto do pinto um close do pinto um pinto ereto na minha tela sem pernas, sem corpo, sem mãos sem homem
um pinto sem história decepado e duro um falo que não fala e mesmo que falasse não me diria nada
um pinto solto que eu não conhecia e nem tinha imaginado um dia as formas, a potencia a essência a geometria
um pinto que não me excita antes me desanima pela falta de empatia com o universo feminino
ele me mandou a foto do pinto e eu que pensava no sorriso eu que pensava nas ruas que a gente andaria eu que sentia as conversas e os vinhos eu que via a companhia o abrigo, o carinho
vi o pinto um pinto imponente dominador furador de sonhos protagonizando a nossa história interrompida
LEGADO mulheres que faziam café vestiam os filhos dormindo colocavam para tomar sol o tio idoso e as roupas de inverno acompanhavam os maridos nas rezas da igreja e nas passeatas políticas
mulheres que tinham ajudantes desde a casa colonial que cuidavam das finanças das aparências e do destino de cada membro desse partido chamado família
mulheres que pariam com a força com que empurravam os dias sorriam para o gato brincavam com as crias quebravam o pescoço da galinha humanas e alienígenas
mães de gerações inteiras leitos de leite e de seiva humildes em suas redondezas que não ditavam mas conduziam
mulheres que carregavam mundos com o orgulho de um pavão sem plumas
À FLOR DA PELE a pele muito mais que casca, derme que adere à alma. a pele muito mais que veste, que protege e guarda. a pele alarga, a pele estica, a pele transcreve, transita, transcende as percepções da vida.
a pele é ponte entre as células do céu e as estrelas do ser. a pele arrepia, a pele abre, a pele dissocia, a pele extravasa.
a pele é passagem livre de energias. a pele ensina, aprende, se estende e se comprime.
a pele transparência das vísceras.
Publicado por Rubens Jardim em 20/05/2017 às 21h19
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