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AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (93ª POSTAGEM)
ALÍCIA DUARTE PENNA (19 ) poeta mineira, é professora de arquitetura e urbanismo, na PUC mineira, crítica de arte, arquiteta e geógrafa. Em 2005, escreveu sobre a artista Rosângela Rennó, no livro Fotoportátil. Em 2012, publicou o livro de poesia Quarenta Poemas em Dez. AOS HOMENS DE PÉS BRANCOS I Há (talvez) uma escola daqueles homens que sempre avisto na rua, os pés firmes nas sandálias havaianas que os dedos tesos transformam em botas de passos urgentíssimos e retos, cobertos por um pó-branco: prumo-linha-esquadro-nível, dias-meses-anos, irredutíveis. II Serão necessários: a data de nascimento, o número da carteira de identidade, o número de projéteis cravados na carne, a hora da morte, os exatos finitos, para que: o médico legista conclua a autópsia, o juiz autorize o sepultamento, o cartório libere o atestado de óbito, a prefeitura conceda o serviço funerário gratuito, para que uma mulher, que espera, uma filha, que espera, possam se despedir daquele homem há dias atingido quantas, quantas vezes, na porta da casa que era a sua, na rua onde é difícil chegar água, luz e o carro de horrível nome rabecão. E, enquanto esperam, ninguém as ouve contar outra história (a do homem que ensinaria a outros homens as noções de prumo, alinhamento, esquadro e nível), nem supõe a fome que sentem, ali, e sozinhas. UM QUARTO DE SÉCULO Sofrer é pouco. Ser feliz é pouco. Quero o destino de volta! O tremendo destino que tinha aos quinze anos, o imperativo dedo de Deus apontando o absoluto: sim é Sim, não é Não. POBRES MOÇAS Por que se olham – chispas – como estranhas as moças? Curiosidade não têm uma pela outra? Sendo moças, que pouco viram, por que se desviam, contrariadas, daquela que é outra, mas si? Acaso desejariam pertencer a humanidade alguma? No temor da não-coisa, o olhar anoitecido, retêm suas sacolas junto ao peito: as coisas às coisas salvarão. Uma certa blusa, este cabelo, o ar e a invencibilidade, apostam (no encontro para o qual se preparam não se forma par: vencedor e vencido saem separados ao final). Desconhecem – desconhecerão sempre, sempre, até velhas, até depois de velhas?- os manuscritos, a revolução, a liberdade? Em linha marcham: dessemelhantes, desamorosas, ah, pobres moças. Mas eis que uma se desvia, oh, e amanhece! A UM PASSANTE Você não é belo ao passar. Pálido ou indesculpavelmente branco, cabelos recém-lavados, óculos espelhados, de corrida como os de um cavalo, o aro amarelo mal se equilibrando no rosto de ossos, civil, moderna, heroicamente feio. Traficante, dono da boca, do pedaço? Não sei, mas sabe você como haverão de saber outros. A caminho da favela, seus passos – planos – estão traçados, como os meus. Em círculos caminho, circunscrita, ou corro, presa da organização – outra? – de que preciso, ser-no-mundo vasto e sem solução. Raimundo poderia ser o seu nome quanto o meu, em letra somente para poucos decifrável, assinados em multidão. MARCELA MARIA AZEVEDO(19 ) poeta pernambucana, já morou no Pará e vive atualmente no Rio de Janeiro , onde faz doutorado na UFRJ e estuda as relações entre Poesia e Psicanálise. É mestre em psicologia, e está finalmente preparando o material para publicação de seu primeiro livro: todas as mães são tiranossauras. eu parti como se cada figura minha precisasse de abandono. saio de casa ao amanhecer de corpo mudo deixo minhas tralhas, lençóis, livros que há anos ardem em meu respirar e te renuncio cautelosa, além do horizonte matutino onde naturalmente as coisas se transformam e as memórias se desfiguram, ingênuas em nosso despertar. eu sinto muito, pai mas já não conseguia suportar minha outra mulher. AOS HOMENS QUE USAM ALGUNS GRAMAS DE ANALGÉSICO PARA FINGIR UMA ILUSÃO que colocam os quadros de família no centro da sala de estar junto de almofadas importadas e tapetes carregados com a poeira do século falam com as bocas cheias de nunca peço desculpas e derramam gordura nas toalhas de mesa de suas mães a vocês que nos tiram a presidência os ministérios os peitos caídos as bundas murchas e o nosso envelhecer eu ainda uso as mesmas roupas aqueles farrapos históricos que sobraram dos anos 80 cheios de rostos que são como cemitérios a sua dor de cabeça vem do centro de sua mãe e ela dói como dói uma mulher por sermos diariamente extintas e tiranossauras EXPLICAÇÕES SOBRE A BIOLUMINESCÊNCIA ou um ensaio sobre a saudade este poema começa com três palitos de fósforo e um cigarro perto da janela : fiat lux comunicação luminosa você na cadeira ao lado asmática em mil novecentos e noventa e seis - eleonora se foi - depois eu já não sei o que penso pensando em você todos os dias há manhãs que somos anne sexton suicidadas em nossa própria casa com um pouco de vodka e sylvia plath jornais acumulados isqueiros guardados na segunda gaveta meu útero podado há manhãs que tudo são fótons em ascensão e ascendência da chama que guardo inteira acesa com teu gosto e adeus. POR UM CONSENTIMENTO EVOCATIVO DE TERNURAS eu visitei o quarto de frida kahlo, sister vi mulheres de batons rubi com a mesma cara amarela da nossa mãe : a que ela usa nas fotografias dos álbuns de família e nas caixas deixadas ao avesso de qualquer solidão. don’t do that, woman let me get you another drink intervalo uma mulher uma qualquer dessas que existem num atlas de imagens invisíveis sentada num banquinho de 30cm de onde assiste o percurso do sol enquanto faz seu [crochê brincando de nostalgia com o toque da agulha que eventualmente perfura os seus dedos e lugarejando o mundo com um olhar marejado eu visitei o quarto de frida kahlo, irmã tinham potes de lágrimas junto à foto de diego e eu só conseguia dizer à minha mãe : please don’t do that, my woman let me get you another drink LUNA VITROLIRA(19 ) poeta pernambucana, declamadora, atriz e performer. Com seus espetáculos de récita performática, Não Os Queríamos Sagrados e Sala de Estar, Luna tem participado de importantes eventos literários como a Balada Literária/ SP; Festipoa Literária/RS; CLISERTÃO/ PE; Festival Internacional de Poesia do Recife/PE; Jornada Literária Portal do Sertão/PE; Bienal do Livro de Pernambuco/PE e outros. MARTELO O amor bate seu martelo sempre no mesmo prego até acertar o dedo HÁ DIAS Há dias em que necessito silêncio e não quero me mexer e não quero falar e não quero abrir os olhos nem sair de dentro de mim Há dias em que sou paz e guerra tumulto condensado em meu tumulo alguém que tenta ler o futuro no lodo das horas procurando sonhos dentro de um balde Há dias tenho sono vivo exausta da ignorância alheia E sinto saudade do pé de manga da minha rua onde eu empinava pedras e não pensava na morte O AMOR É feito bala perdida que acerta um desavisado ao cruzar a rua Ao dobrar a esquina Às vezes vem num soco Às vezes num grito O amor às vezes é isso Uma panela de água fervendo no rosto de alguém querido às vezes esmola às vezes migalha que se devolve com um tiro ou acaba em facada o amor tem medo da vida uma hora eleva na outra arrasta desconfia da sorte tem medo da falta O amor corresponde à entrega com uma rasteira e às vezes mata De tirania De asfixia de ciúme De raiva Como alguém que se alimenta e de repente engasga CREDO Eu acredito no amor de porta de banheiro de muro pichado de acento de ônibus de alto de prédios de orelhão quebrado
No amor que singra as pontes do Recife ao meio dia que corre pra cruzar a rua driblando buzina no meio da vida no amor que xinga e colhe uma flor corresponde um aceno
acredita em destino e acaso ama e odeia ao mesmo tempo Eu acredito no amor de Eurídice e Orfeu no amor que desce ao inferno e volta de mãos vazias no amor de Medéia, de julieta e no meu que não ultrapassa o clichê de um sonho de padaria
Eu acredito no amor de uma criança por seu cachorro e seu boneco sem fazer distinção de afeto, porque em ambos lhes cabe vida no amor pelo feio, pelo disforme, pelo que é ignorado no amor que zela e machuca com veneno e cuidado Eu acredito no amor de Nena por sua bodega
no de Deja por seu Jardim no de Seu Castelo por sapos
no de Dona Chocha pelas roupas e no de Angela por seus gatos acredito no amor que corre as ruas da minha infância no amor que dá bom dia que ajuda uma velha a segurar sacolas
ou no amor que empresta seu ombro como guia pra atravessar o delírios das horas mortas acredito no amor da minha mãe por mim e mais ainda pelo vício de cigarro com coca-cola no amor que acontece nos becos, as escuras, sobretudo e todo amor que nasce proibido e permanece clandestino a espreita pra quem sabe se tornar público no amor de duas vulvas no amor entre dois falos no amor que se embaraça e serena pra findar grisalho no amor que não tem número que geme, rosna e grita vulnerável, enciumada
infiel e homicida de posse e possessão
amor que supera as distâncias da convivência que muda de calçada nas brigas e se mostra mais amor em complacência e não sucumbe aos apelos da liberdade ou de uma prisão amor de banco de praça que desalinha
mas depois entrelaça amor que se despede se desespera se despedaça
amor que não cabe num ínfimo segundo em que a morte o assalta ADÉLIA DANIELLI(19 ) poeta potiguar, cursou letras e ciências sociais na UFRN. Divulga poemas na internet e participou de três publicações coletivas: o livro Por cada uma (2011) e os zines Entre Seios e Revoada. Seu primeiro livro solo, Bruta, foi lançado em maio de 2016, Numa sexta-feira 13. Minha anatomia minha autonomia à disposição da sua língua vadia .............................................................. No interior das coxas uma lambida e uma mordida mel e pão no café da manhã ...............................................................
venha me tomar de corpo e alma tomar meu ar meu café a poesia que paira sobre esse lugar que se instaura em cada coisa da sala nesse momento em minhas mãos em minha mente em mu coração venha me tomar absorer a canção do silêncio da fumaça saindo da bca da calmaria real desacelarada e presnete no momento presente sem lucidez ou utopia sem metafísica sem reparar nas horas sem saber qual é esse dia apenas venha me tome me absorva .........................................................
há uma linha tênue entre todas as músicas que mais amo e seu sorriso conversas sobre tempo e espaço não me resgatam do lugar em que me encontro apenas eu dançando pra você e o nada meu processo criativo está fascinado pelo jeito que você fala tem uma charla no discurso bem argumentado e os olhinhos que hora se apertam hora estão arregalados me perco nas ruas que ando todos os dias pego os mesmo ônibus errados uso pares de sapatos trocados porque eu não estou mais em mim
Publicado por Rubens Jardim em 12/06/2017 às 23h31
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